Não existe livre-arbítrio. Eu controlo você e ponto final
Olá, meu nome é Pedrão, como vai? Tenho escrito alguns artigos neste site, mas senti necessidade de falar um pouco de mim, para você me conhecer melhor e para que a gente possa estreitar e fortalecer nossa relação.
Se é necessário administrar os padrões que você carrega, ninguém melhor do que eu. Sou um capataz dedicado e exigente a serviço do seu cérebro. Mas assumo, não tenho bom senso nem flexibilidade. Para mim é tudo preto ou branco. Não existe cinza. Eu sou aquela voz interior que diz pra você o que é “certo” ou “errado” e te controlo de uma maneira absoluta. Tudo o que você pensa, faz e sente é controlado por mim. Minha missão na vida é fazer de tudo para que você reaja conforme sua programação mental. E devo dizer que sou muito bem-sucedido nesta tarefa.
Te cuida, Schwazenegger
É bom deixar claro logo na largada que sou um cara arbitrário, absolutista, autoritário, despótico, ditatorial, dominador, opressor, prepotente e tirânico. Mas te amo. Para você ter uma ideia de como eu sou fisicamente, pense num cara forte, daqueles que fazem concurso de fisiculturismo. Agora dobre o tamanho dele, pinte o corpo de azul e bote uma cara de poucos amigos. Um amontoado de músculos a serviço dos padrões. Este sou eu: o Pedrão. Muito prazer. Eu vivo dentro de você desde que nasceu mas ainda não tínhamos sido apresentados. Feitas as apresentações formais, que é como eu gosto, vamos às minhas credenciais.
Devo dizer que o meu patrão, o cérebro, é bem mais flexível que eu. Pouco, mas é. Em certos momentos resolve intervir no meu trabalho e abrir exceções às minhas rígidas regras. Aliás, saiba de uma vez que não sou brasileiro. Comigo não tem jeitinho, não tem “quebra essa, amigão”, não tem papo furado. Eu sou assim: preto no branco, pão-pão, queijo-queijo e mais quantas frases feitas você conhecer para definir alguém incapaz de mudar, de relaxar, de aceitar novidades.
Só o cérebro, como regente supremo, tem a prerrogativa de contrariar as leis e as regras estabelecidas por ele mesmo, quando assim julgar necessário. Nem sempre concordo com ele. Reconheço que se não fosse assim, você não teria a capacidade de aprender nada, de lidar com novidades e surpresas, enfim, de adaptar-se, o que obviamente faria sua vida ser impossível. A começar por falar, andar, ir ao banheiro e todo o resto de atividades que você desenvolveu como indivíduo autônomo.
Sou um sujeito muito tenaz e trabalhador. Tenho muita responsabilidade em minhas mãos e não fujo dela. Se necessário for, brigo com você para manter as coisas como estão. Afinal, em time que está ganhando, não se mexe.
A culpa é toda minha
As más línguas dizem que não sou real, que sou apenas uma metáfora criada pelo Henrique Szklo utilizada para te influenciar psicologicamente no momento em que você precisa desbloquear criativamente. Balela. Dizem que sou apenas uma alegoria, que serve apenas para tirar de você o peso da auto-cobrança em razão de uma eventual dificuldade em criar. Pode até ser, mas não acho que seja assim. Acho injusto comigo. Você quer liberdade, quer criar, quer pensar livremente. Aí não consegue e diz que é por minha causa? Tenha a santa paciência. Mas se isso te deixa feliz, pode botar a culpa em mim. Eu não ligo.
Sou um ventríloquo e você é meu boneco
Você, por acaso, acreditava em livre-arbítrio? Desculpe, mas isso não existe. Sejamos francos: você não passa de um títere nas minhas poderosas mãos. Você não faz praticamente nada sem minha autorização. Ao contrário, a imensa maioria das coisas que você faz, diz e pensa é da autoria deste seu criado.
Você acredita mesmo que tem autonomia para pensar, que ninguém o controla, que você é uma alma livre, leve e desprendida de amarras? Hahahahaha. Santa ingenuidade, Batman! Você é apenas um boneco sentado no meu colo. Eu controlo seus movimentos e sua fala. Toda vez que você gira a cabeça é porque eu assim o quis. E praticamente tudo o que você fala (pelo menos enquanto está mentalmente são) sai da minha boca e não da sua. Mas como todo bom ventríloquo, dou a impressão de que quem fala é você, encantando e divertindo a plateia.
Bem, vou deixar você aí refletindo sobre o que acabou de descobrir. Acredito que tenha muito o que deglutir. Sei que pode ser difícil de aceitar. Mas como diz o outro: aceita que dói menos. Semana que vem volto para falar um pouco mais da nossa bela relação. E você vai ler tudinho!