A História das Coisas

Quando a moda feminina era ficar presa numa gaiola

A história da crinolina contada pelo guitarrista da banda Queen

O guitarrista da banda de rock Queen, Brian May, é astrofísico e ativista da vida selvagem. Mas resolveu escrever, pasme, um livro sobre a história da crinolina – aquelas armações usadas sob as saias das mulheres no século 19 – juntamente com o colega entusiasta e estudioso Denis Pellerin: Crinoline: Fashion’s Most Magnificent Disaster (Crinolina: o desastre mais magnífico da moda, em tradução livre).

Por volta de 1840, as saias começaram lentamente a ficar mais largas. Na década seguinte, uma bainha podia medir até 1 metro de altura. Para conseguir a aparência robusta, uma mulher podia ser embrulhada em até 15 quilos de musselina, chita, flanela e crina de cavalo – uma combinação tão quente quanto anti-higiênica.

Os projetos eram criativos, para dizer o mínimo: usavam cana, que estalava tanto que parecia ter aqueles cachorrinhos pentelhos mordendo os tornozelos das mulheres. A solução para resolver este problema cinófilo foram tubos de ar de borracha, que uma empregada ou um marido dedicado inflavam utilizando um par de foles. Era, literalmente, um vestido inflável.

A engenhoca que finalmente “resolveu” o problema foi inventada em 1856 por uma solteirona parisiense e recebeu vários nomes, como anágua de esqueleto, gaiola, carcaça ou saia de argola. Mas o nome que pegou mesmo foi crinolina. Foi um sucesso estrondoso. No auge de sua popularidade, nas décadas de 1850 e 1860, a demanda era tão alta que os fabricantes não conseguiam dar conta das encomendas.

Chargistas não perdoavam a engenhoca

Mas a melhor parte desta história, são os acidentes que a geringonça fashionista provocava em quantidades industriais. Senhoras descuidadas trombavam com transeuntes, alguns dos quais ficavam inconscientes; derrubavam móveis leves; ficavam entaladas nas portas; e enroscavam nas rodas das carruagens e em máquinas de moinhos, etc. O pior de tudo: o troço pegava fogo, já que geralmente eram cobertos de tecidos inflamáveis. Estima-se que cerca de 300 mulheres foram queimadas a cada ano – algumas até morreram, incluindo as duas meias-irmãs de Oscar Wilde.

Desenhos animados da época mostravam maridos que não conseguiam dar a mãos às esposas, mulheres usando a crinolina como um dispositivo anti-roubo (nenhuma pessoa podia chegar perto da bolsa), e seus filhos usando as gaiolas como brinquedos ou trajes de banho. Na verdade, as saias funcionavam muito bem como boias e chegaram a salvar muitas mulheres do afogamento. Dizem os mais exagerados que também impediram alguns suicídios, agindo como uma forma de paraquedas.

As crinolinas eram inacessíveis para a classe trabalhadora, mas isso não impedia que garotas criativas e os empregados mimetizassem a saia que estava na moda. Utilizavam barris enferrujados, suas cercas de arame e cordas de carroça. De onde se conclui que a pirataria de grifes começou antes do que se pensa.

Mulheres não muito sérias, mas inteligentes, aproveitavam o design da crinolina para esconder os amantes e até para contrabandear mercadorias. Entre os itens apreendidos nas alfândegas francesas estavam perdizes, lebres, coelhos, tabaco, pólvora e álcool.

Realmente, por alguma razão desconhecida, o desconforto quase sempre fez parte do guarda-roupa das mulheres que querem estar na moda desde que existe moda. Talvez seja uma espécie de expiação, um castigo divino pelo fato de termos comido aquela maldita maçã.

 

Mostre Mais

Lena Feil

Gaúcha de nascimento e cidadã do mundo por opção, é formada em Desenho Industrial e Psicologia, é feminista e pensadora em período integral. Usa o cérebro para entender o cérebro. Estudiosa do comportamento e da criatividade, entusiasta da vida, viciada em novidades, em filosofia, no ser humano e em coisa mundanas também. É absolutamente fascinada por crianças, adora café, ama viajar, é geralmente divertida, e – às vezes – esnobe. Hoje, atua com Coolhunter do Portal Mentes Criativas, sempre em busca do que existe de mais subversivo, inteligente e relevante em todas as partes do mundo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Artigos Relacionados

Botão Voltar ao topo