Só leia este artigo se quiser sobreviver
A criatividade como ferramenta de sobrevivência
Não vou nem falar dos Filósofos de Linkedin porque me dá arrepios. Então, vamos aos dicionários onde encontramos no verbete CRIATIVIDADE algo mais ou menos assim: “inventividade, inteligência e talento, natos ou adquiridos, para criar, inventar, inovar, quer no campo artístico, quer no científico, esportivo etc”. Que me desculpem os zelosos protetores de nosso vernáculo, mas neste caso serei obrigado a discordar. “Natos ou adquiridos”? Nem pensar. Não existem duas alternativas. A criatividade é genética. E democrática.
Criatividade não é dom. Não passa nem perto disso.
Deus não fica numa linha de montagem celestial decidindo individualmente quem contará com esta característica que nada tem de divina. É apenas uma questão de lógica. Todo mundo tem capacidade de produzir ideias. De pequenas melhoras cotidianas (o que é mais comum) até revoluções. E não importa a área, formação ou atividade do cidadão. E não que você precise se preocupar com isso, mas também tem pouco a ver com inteligência. Aquelas pessoas que você considera limitadas também são capazes de criar, de melhorar sua condição por meio de conexões e associações de ideias realizadas de forma intuitiva. Até porque a capacidade de improvisar soluções diante de contratempos é a marca registrada de nossa espécie.
Racionais ou irracionais, somos todos animais

Todos, absolutamente todos, possuímos uma capacidade inata de improvisar. O improviso é uma ferramenta fundamental para a sobrevivência. Sem ela, as possibilidades de sobreviver diante de novos e não-identificáveis eventos seriam perigosamente reduzidas. E é por isso que qualquer animal – eu, você, sua sogra, seu cachorro, a zebrinha na floresta – quando se vê diante de um problema novo, algo que jamais enfrentou ou conheceu, uma luzinha vermelha se acende no interior do seu cérebro chamada instinto de sobrevivência. A partir daí, só pensa em uma coisa e em uma coisa somente: sobreviver. Inconscientemente e em questão de fração de segundos, várias perguntas se misturam em sua cabeça. Como sair daqui vivo? Como resolver uma questão tão séria se eu não tenho informações suficientes? Como reagir diante do desconhecido? Como enxergar o todo se faltam peças no quebra-cabeças? Como responder a perguntas que nunca foram formuladas?
O improviso nos mantém vivos

Diante de um dilema desta magnitude, em que sua integridade está em perigo (pelo menos a sua percepção é de que esteja) não resta mais nada ao pobre bichinho do que tentar resolver a questão, vamos dizer assim… no chute. Então ele IMPROVISA. E esta prodigiosa capacidade de improvisar é que faz com que nós, bichos, aumentemos exponencialmente nossas chances de sobreviver. Não fosse ela, não teríamos condições de imaginar soluções nunca dantes experimentadas. Morreríamos ao primeiro desafio desconhecido. Ela, portanto, também nos fornece condições de nos adaptarmos ao ambiente, já que além de modificarmos nosso comportamento em razão das circunstâncias externas, também aprendemos com as experiências. Então, pode anotar aí no seu caderninho mental:
A capacidade de improvisar é uma ferramenta de sobrevivência e adaptação dos animais.
Antigamente o homem, como todos os animais, só improvisava quando se via diante do perigo. Depois que nosso cérebro deu um salto qualitativo, a luta pela sobrevivência também ganhou contornos marcantes. Descobrimos que poderíamos improvisar previamente para lidar com algo desconhecido ou para ampliar nossa capacidade de enfrentar uma ameaça qualquer. Essa competência em particular influenciou de maneira determinante os passos de nossa espécie a caminho da evolução e se transformou no que hoje chamamos de Criatividade.
“Criatividade é a evolução da capacidade de improvisar” Henrique Szklo
A capacidade de improvisar é uma ferramenta pontual, ou seja, serve para momentos específicos da vida dos animais, colaborando na solução problemas relacionados à sua sobrevivência. E é aí que nós nos separamos de nossos parentes irracionais. Para o bem e para o mal, o cérebro humano evoluiu de forma tremenda e nossa capacidade de improvisação cresceu junto com ele. Essa evolução extraordinária fez com que consigamos improvisar não apenas em situações de perigo ou ameaça à nossa integridade, mas também improvisamos sob demanda, improvisamos com antecipação de demanda, improvisamos por improvisar até. A capacidade de improvisação e a Criatividade são duas maneiras diferentes de nomear o mesmo fenômeno. A diferença está apenas na intensidade.
Todo mundo é criativo. Não tem como não ser

Todo mundo improvisa em seu dia-a-dia. Em pequenos, médios ou grandes eventos. Quem nunca abriu uma geladeira para ver o que tinha disponível e a partir daí criou um prato original, apenas juntando o que encontrou? Foi um improviso e, ao mesmo tempo, um gesto criativo.
Você faz o mesmo caminho ao trabalho todo dia. Mas e quando uma das ruas pelas quais você passa está interditada para obras, o que fazer? Improvisar. Perguntar para alguém na rua, ligar para alguém, ligar o Wase, seguir os outros carros, enfim, você vai resolver o problema da forma que conseguir. É claro que existem pessoas inseguras que vão surtar e ter um ataque de pânico e não sair do lugar. Mas mesmo estas pessoas não vão ficar ali esperando a obra terminar para seguir viagem. Nem vão voltar para casa de ré e ligar para o chefe dizendo que não poderá trabalhar enquanto a rua não for liberada. Todo mundo vai tentar achar uma solução para este problema inédito. Todo mundo vai usar a criatividade. Te vira, Mané!