Blog do Henrique Szklo

Pensamento negativo é um vício que precisa ser tratado

O pensamento negativo é um padrão que se constrói ao longo de uma vida de derrotas e fracassos. O cérebro aprende com o quer acontece à sua volta.

Quando estamos diante de alguém com algum tipo de vício, muitos pensam ser falta de força de vontade para sair do inferno, mas os mais bem informados sabem que, na verdade, o vício nada mais é do que uma doença.  Todo vício é resultado de uma dependência química. E são dois modelos distintos: de um lado temos aqueles que se alimentam de drogas adquiridas. Do outro, um tipo de droga produzido pelo próprio cérebro. Vícios como sexo, jogo, trabalho, ou qualquer outro que faça com que a pessoa seja obcecada por alguma atividade/ideia/pessoa, também podem ser colocados na mesma categoria que o vício por drogas e álcool. O indivíduo está preso em sua obsessão e não sabe como sair. Às vezes está tão mergulhado, que nem sair quer. Provavelmente por que acha que não é necessário. Que não é verdadeiramente viciado.

Metaforicamente, acredito que a droga que encarcera o viciado é um Hormônio Disciplinar* chamado “Parabéns a você!”, que nada mais é do que parte de um sistema cerebral que nos premia por estarmos “certos”. Seja com a droga externa, seja com a interna.

Apesar de parecer que não, para mim o pensamento negativo também é um vício provocado por um desequilíbrio mental e como tal, pode e deve ser tratado. Mas como todo vício, o processo é doloroso e lento, muitas vezes demonstrando-se inócuo.

O princípio do vício é a busca pelo que eu chamo de Fonte de Prazer. Consciente ou inconscientemente procuramos fontes de prazer o tempo todo. Não tem nada de errado nisso. Precisamos mesmo sentir prazer, claro. O problema surge quando, por alguma razão, não conseguimos várias fontes, nos concentrando em apenas uma. Se eu gosto de ler, de jogar futebol, ouvir uma boa música, trabalhar, da família, etc, a fonte de prazer está diluída e a perda de alguma delas não vai fazer grande diferença. Porém, se encontro uma Fonte de Prazer que satisfaça boa parte de minha necessidade, a tendência é que eu me concentre nela. Afinal, pra que pegar um grãozinho de cada vez se eu posso pegar o pacote todo?

Porém, fica claro que não podemos viver pendurados em apenas um elemento. A diversidade é fundamental para nossa sanidade. O risco de perder a única joia de valor que temos acaba por trazer a dor associada ao prazer. Insegurança, medo, angústia, ciúmes, agressividade.

Diante deste quadro, não é estranho concluir que para se desconectar desta Fonte de Prazer, um grande esforço deverá ser feito. Ninguém sai de um vício apenas com decisões racionais. O cérebro não vai permitir essa mudança sem lutar com bravura e determinação. Ele, por definição e modus operandi, não entende e, portanto, não aceita, que seja possível o prazer estar associado a algo que esteja “errado”. Se tem prazer, está “certo”. É a lógica de nosso inconsciente. Para alterar este estado de coisas, será preciso uma reordenação mental, uma reprogramação profunda, uma quebra de padrões. E isso só se consegue com esforço, com tempo e, não raro, acompanhamento de terceiros para evitar recaídas. Inclui absoluto distanciamento daquela Fonte de Prazer específica e busca por substitutos, obviamente, em quantidade.

As recaídas ocorrem, mesmo com aqueles em estágio avançado de recuperação, porque o cérebro aprendeu que se quiser prazer, bastará recorrer àquela fonte específica. Se estamos angustiados, tristes, infelizes, é seguro que iremos atrás de algo que nos proporcione uma saída imediata. A comida talvez seja uma das mais evidentes mostras deste processo. Uma fonte de prazer que geralmente está a poucos passos de distância.

O pensamento negativo é um padrão que se constrói ao longo de uma vida de derrotas e fracassos. O cérebro aprende com o que acontece à sua volta. Se a pessoa falha seguidamente em atingir seus objetivos, é provável que seu cérebro, principalmente sua porção inconsciente, passe a acreditar piamente que “dar errado” é o “certo”. Parece contraditório mas não é. Quando frequentamos durante longo tempo o mesmo universo, a tendência é que nos acostumemos e ele se transforme em zona de conforto, que eu prefiro chamar de Zona de Familiaridade.

O problema da palavra “conforto” nesta expressão, é que a confundimos com prazer, com um sofá macio e aconchegante. Não tem absolutamente nada a ver com isso. Zona de Familiaridade é aquele lugar com o qual estamos acostumados. Ponto. Se estamos muito tempo na merda, nos acostumamos a ela. E pior: qualquer movimento em direção à saída da merda será devidamente solapado por nosso inconsciente por meio de uma ação que comumente chamamos de “tiro no pé”. Vamos dizer ou deixar de dizer algo, fazer ou deixar de fazer algo que impeça o progresso e prosseguimento da mudança. E não concordo que a palavra que se usa para explicar este momento: boicote. Não é boicote. Nosso inconsciente jamais nos prejudicaria por vontade própria. Ele está apenas nos mantendo dentro de nossos padrões, o que para ele é certíssimo, o que garante nossa sobrevivência.

Então, para convencer o cérebro de que os passos que queremos dar são aqueles que ele deve defender, precisamos criar contra-padrões, ou seja, padrões que sejam tão ou mais fortes que os atuais e que contemplem os caminhos que o cérebro racional decidiu serem os melhores e mais adequados.

Por isso, sem brincadeira, acho que deveria haver uma espécie de Clínica de Reabilitação do Pensamento Equilibrado, onde pessoas com pensamento negativo possam transformar seus padrões fazendo seu inconsciente aceitar um novo padrão que é “vai dar certo!”. Assim mesmo, afirmativo, radical. Como eu disse, para se lutar contra um padrão arraigado é preciso lutar com força inversa e desproporcional. É nossa única chance. Mas na verdade, acho que não vai dar certo. Quer saber? Desista. É inútil. O mundo te fez assim e assim você viverá até seus últimos dias.


*O que são os Hormônios Disciplinares

Mostre Mais

Henrique Szklo

Cientista da Criatividade, nasceu em Belo Horizonte (MG), é graduado em Publicidade e Propaganda pela FAAP e pós-graduado em Neuropsicologia pela FAMEESP. Exerceu durante 18 anos a profissão de publicitário na área de criação, como redator e Diretor de Criação. Além disso é escritor, professor, designer gráfico, palestrante e palpiteiro digital. É professor do MBI da UFSCar e Publisher do Portal Mentes Criativas. Tem 8 livros publicados (humor e criatividade), é palmeirense e não-negacionista.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Artigos Relacionados

Botão Voltar ao topo